30 AGOSTO 2024
MÊS DA BÍBLIA | DIÁCONO MÁRCIO JOSÉ PELINSKI
Há 53 anos a Igreja Católica no Brasil (CNBB) elegeu setembro como Mês da Bíblia, em homenagem ao patrono das Sagradas Escrituras, São Jerônimo (comemorado em 30/09 – Dia da Bíblia Católica). Este mês temático, apresenta um objetivo pastoral: propagar e aprofundar estudos sobre os escritos bíblicos junto das comunidades cristãs católicas brasileiras.
A animação bíblica das comunidades ocorre por meio da escolha de um livro anual para estudo, alternadamente entre os livros do Antigo e Novo Testamentos. Para este ano de 2024, o livro escolhido foi o de Ezequiel: o terceiro livro profético na ordem atual dos profetas do Antigo Testamento das bíblias. O nome “Ezequiel” significa: “El (Deus supremo) é forte” ou “que Deus fortaleça”.
No contexto histórico do escrito, Ezequiel tem como pano de fundo o exílio da Babilônia, ocorrido no século VI a.C. Período onde houve deslocamento da referência social, religiosa e nacional dos israelitas por cerca de meio século. Além de todas as implicações sociais e políticas, a deportação gerou uma crise religiosa para o povo: a fé de Israel estava ligada à terra recebida em promessa e à aliança com um Deus guerreiro. Segundo Marileda Baggio, nas migrações forçadas, há ambiente propício para que se percam as raízes, os vínculos e as ligações afetivas. Não há tempo para uma migração planejada, podendo ser uma crise de espiritualidade na divindade (cf. 2014, p. 264). É importante nestes eventos o surgimento de lideranças com vozes de esperança em meio ao ambiente de instabilidade, aqui ganham proeminência os profetas escritores do período: Jeremias, Lamentações e Abdias que narram a perspectiva de junto dos que ficaram na terra dominada e os exilados Dêutero-Isaías (Is 40-55) e Ezequiel que profetizam junto dos deportados na Babilônia (cf. PELINSKI, 2021, p. 26-29)
O pesquisador Pe. Shigeyuki Nakanose, destaca na Introdução da Bíblia Nova Pastoral que Ezequiel é profeta de origem sacerdotal, de atuação na corte e que prega temas semelhantes aos do primeiro Isaías: Deus de Israel (poderoso, glorioso e transcendente); Davi como protótipo ideal de rei; monarquia e liderança davídica defensora da justiça; reunificação de Judá (Sul) e Israel (Norte) e reconhecimento divino nacional “Eu sou Javé” (Ez 7,9). (2014, p. 1033). Nakanose registra ainda a seguinte proposta de organização dos 48 capítulos da obra profética (2014, p. 1035-1036):
- Vocação do profeta (capítulos 1,1-3,21)
- Oráculos sobre a destruição de Jerusalém (capítulos 3,22-24,27)
- Oráculos contra as nações (capítulo 25-32)
- Oráculos de salvação para Israel (capítulo 33-39)
- Visão da Nova Jerusalém e do povo restaurado (capítulo 40-48)
Para a Ir. Zuleica Silvano, “O estudo do Livro de Ezequiel visa uma tomada de consciência do papel profético de cristãos e cristãs ou de pessoas interessadas em viver a vontade de Deus [...] denunciando as injustiças e anunciando a novidade do amor de Deus [...] despertando a esperança, para consolar aqueles e aquelas que experimentam a perda, o sofrimento, a aflição, de forma especial os ‘exilados’ e ‘exiladas’ de sua terra por causa das guerras ou as pessoas em busca de melhores condições de vida”. (2024)
O livro apresenta para nossos dias uma atualidade de interpretação. Se Ezequiel alertou e “esperançou” seus contemporâneos, sua palavra ressoa hoje com força renovadora para uma Igreja servidora, profética, em saída, sinodal e que nasce do vigor batismal. Ilumina o texto profético:
“Derramarei sobre vós uma água pura e vocês ficarão purificados. Purificarei vocês de todas as suas imundícies e de todos os seus ídolos. Darei a vocês um coração novo e colocarei um espírito novo dentro de vocês. Tirarei o coração de pedra e lhes darei um coração de carne. [...] Vocês serão o meu povo, e, eu serei o Deus de vocês!” (Ez 36,25-26.28b).
Desejo que, com a leitura do profeta, o Mês de Setembro de 2024, seja uma oportunidade de contato, estudo e aprofundamento da espiritualidade que brota da Palavra de Deus e inspira toda a vida. Que Deus fortaleça!
Diác. Márcio José Pelinski - Mestre em Teologia (Exegese e Teologia Bíblica) pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Professor do Bacharelado em Teologia Católica do Centro Universitário Internacional (UNINTER). Diácono Permanente na Diocese de São José dos Pinhais (PR). Assessor Pedagógico da Comissão Nacional de Diáconos (ENAP-CND/CNBB).
Imagem – Arte de Sérgio Ceron no Evangeliário da Paróquia Nossa Senhora Rainha da Paz (Borda do Campo – SJP) – Foto: Márcio Pelinski (2023)
REFERÊNCIAS E INDICAÇÕES DE OBRAS PARA APROFUNDAMENTO:
BÍBLIA PASTORAL. Nova Edição. São Paulo: Paulus, 2014.
BAGGIO, Marileda. Quando diferença e acolhida se encontram: Igreja e Migrações. Teocomunicação, v. 44, n. 2, pp. 262-280, 2014.
Comissão Episcopal para Animação Bíblico-Catequética da CNBB (Org.). Mês da Bíblia 2024 – Livro de Ezequiel: texto-base. Brasília: Edições CNBB, 2024.
NAKANOSE, Shigeyuki. In. BÍBLIA PASTORAL. Nova Edição. São Paulo: Paulus, 2014.
PELINSKI, Márcio José. A vocação para o direito e a justiça no primeiro canto do servo de YHWH. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Curitiba, 2021. 148 p.
ROSSI, Luiz Alexandre Solano. Livros Proféticos e Sapienciais: profecia e sabedoria para bem viver. Curitiba: Intersaberes, 2019. (Série Princípios de Teologia Católica).
SILVANO, Zuleica Aparecida (Org.). Livro de Ezequiel – “eu vos darei um coração e um espírito novo” (Ez 36,26). São Paulo: Paulinas, 2024.
SCHÖKEL, Luís Alonso; SICRE DIAZ, José Luís. Profetas I. São Paulo: Paulinas, 1988.