04 SETEMBRO 2024

PE. DEOLINO PEDRO BALDISSERA, SDS


Estava em Messica em Moçambique. Fiquei observando uma mulher que tirava água de um poço com muita maestria. Depois de tirá-la e encher o balde colocava-o sobre a cabeça e com muito equilíbrio seguia para sua casa. Depois dela outras mulheres vieram ao poço. Essa é a rotina de muitas delas. Diariamente fazem muitas idas e voltas buscando a água necessária para suas casas, para lá preparar a comida, lavar roupa, dar de beber aos animais e tudo o mais onde a água é necessária. Aquele poço, em tempo de escassez de chuva é muito procurado e o balde com a corda para retirar a água não pára. Uma mulher se abastece, a outra entra na fila e assim o dia todo. Às vezes, a água se esgota e aí a próxima da fila pacientemente espera que o poço reponha água e dê condições para tirá-la novamente. A mulher que espera, já sabe mais ou menos quanto tempo vai demorar para jorrar a água. Assim é o cotidiano das mulheres que se abastecem de água naquele poço. Vi mulheres que além de levar o balde cheio à cabeça, carregavam em suas costas também uma criança envolta na capulana. Cabeça e costas ocupadas e as mãos livres balançando como que impulsionando o corpo para frente.

Vendo a cena me veio à memória o texto bíblico que fala da mulher samaritana que todo dia ia buscar água no poço que o pai Jacó havia dado. Lá houve um encontro com Jesus que transformou o dia a dia da samaritana. Ela encontrou uma água que não conhecia e esta saciaria sua sede definitivamente. A mulher samaritana já estava cansada de fazer isso todo dia, por isso aceitou a oferta da água que Jesus lhe fez. A mulher messicana vem todo dia buscar água no poço, ela também tem sede da água que sacia permanentemente, que é a que Jesus tem para dar. Não sei sua religião e nem suas práticas religiosas, mas creio que ela o encontra em seu dia a dia fatigante. Deus tem muitos modos de se revelar. Certamente que não esquece da mulher do poço de Messica em sua persistência em buscar a água para saciar sua sede e dos seus. Talvez, sem ter plena consciência da presença de Deus junto dela em suas idas e vindas ao poço. Sabemos que Deus não abandona seus filhos e tem carinho especial para os mais simples e pobres que lutam pela vida. Como ela aprendeu a esperar pela água do poço, Deus também a espera para saciá-la plenamente com a Outra Água, a que a samaritana recebeu antes.

Comparando as duas mulheres, a de Messica e da Samaria, ambas tem muitas coisas em comum. Uma relação diária com a água. Água que sustenta a vida, que sacia a sede, que lava roupa, que rega a planta... ambas, se dedicam com persistência, esforço na busca da água porque sabem o quanto é essencial para si e para os seus. Daquelas que vieram ao poço enquanto estive ali, não vi nenhuma resmungando ou reclamando de cansaço ou se lastimando de sua sina. Não visitei a casa da mulher que observei tirando água, mas imagino que com aquela água ia preparar a xima para o almoço e jantar, e saciar a sede  de seus familiares e animais. Quando a água em casa estiver terminando ela sabe onde buscá-la novamente. Lá no poço aonde sempre vai. Se, quando chegar, não houver água, é só ter paciência e esperar que logo o poço vai ter nova água. Por isso ela não perde a esperança e confia que o poço mesmo na escassez de chuva vai manter a vida daqueles que dependem dele. A relação da mulher e o poço é uma relação de confiança e de amor recíproco. O poço em si não depende da mulher e nem precisa dela, mas a mulher depende e precisa dele. O poço é dádiva para todos os que vierem até ele, vão voltar para casa com água em seus baldes. O poço não se cansa de jorrar água, dia e noite está ele ali de prontidão para atender os sedentos. Assim é Deus, em relação aos seus filhos, está sempre de “prontidão” para saciar a sede dos que o procuram. Qualquer um tem acesso a água, basta ir ao poço, ter uma corda e um balde. Foi assim na Samaria da samaritana, é assim em Messica. Essa relação mulher-poço resume bem a busca e a luta pela vida! Há um convívio entre as duas naturezas, a da água e a da humana.

A samaritana teve a graça de encontrar-se pessoalmente com a fonte perene da água que jorra para a vida eterna, a mulher messicana continua sua luta diária para garantir a água que não é ainda a da vida eterna, mas em seu amor à família por quem se sacrifica diariamente, é o jeito certo de caminhar ao encontro dAquela que um dia também a saciará plenamente. Deus não é injusto e é no cotidiano e na simplicidade da vida que se deixa encontrar.

E Assim podemos cantar a música “bendito poço” a beira da estrada... onde as mulheres encontram sempre a água que buscam! A do poço, poço e a do poço que jorra para a vida eterna.